O moçambicano João Paulo Borges Coelho, com o romance «O Olho de Hertzog», foi o grande vencedor da segunda edição do Prémio Leya. O escritor, que concorreu devido ao empenho da sua mulher, preparava uma aula quando soube da notícia em Maputo. «Ainda estou nas nuvens», confessou.
João Paulo Borges Coelho disse por telefone que não sabia ainda o que iria fazer com o prémio, no valor de 100 mil euros, mas que tinha apenas uma certeza, «que continuaria a escrever. Este prémio dá alento (…) Para mim, escrever não é uma profissão, mas uma diversão».
E foi divertindo-se que o moçambicano escreveu «O Olho de Hertzog», o romance escolhido pelo júri do Prémio Leya, presidido por Manuel Alegre (e formado por Pepetela e Nuno Júdice, ambos escritores, José Carlos Seabra Pereira, professor da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Lourenço do Rosário, Reitor do ISPU de Maputo, Carlos Heitor Cony, escritor, jornalista e membro da Academia Brasileira de Letras, e Rita Chaves, crítica literária e professora da Universidade de São Paulo).
«O romance vencedor restitui-nos o contexto histórico dos combates das tropas alemãs contra as tropas portuguesas e inglesas na I Guerra Mundial, na fronteira entre o ex-Tanganica e Moiçambique, o confronto entre africânderes e ingleses, a emigração moçambicana para a África do Sul, a reacção dos mineiros brancos, as primeiras greves dos trabalhadores negros e a emergência do nacionalismo moçambicano, nomeadamente através da imprensa e dos editoriais do jornalista João Albasini. O júri considerou a obra um romance de grande intensidade, em que se conjugam a complexidade das personagens, a densidade da trama narrativa e a busca de O Olho de Hertzog, que é, de certo modo, uma metáfora da demanda do destino individual e colectivo e do nunca desvendado mistério do ser», destacou Manuel Alegre, que sugeriu que a reunião do prémio nos próximos anos seja rotativa, uma forma de celebrar a língua portuguesa, uma sugestão que foi bem vista por Isaías Gomes Teixeira, CEO da Leya. «Este prémio foi criado para celebrar a língua portuguesa. A ideia do júri é muito interessante. Apesar da Leya estar sediada em Lisboa, a língua não tem sede».
O presidente do júri salientou ainda a qualidade do 11 finalistas deste ano, sugerindo a sua publicação, mesmo sem terem ganho o prémio. Isaías Gomes Teixeira revelou também a sua satisfação por ter nas obras finais grandes nomes da literatura da língua portuguesa, «autores consagrados», o que demonstra o valor que este prémio já tem no meio literário, apesar da sua curta vida. «No entanto, por contrato, não posso divulgar nomes», referiu. Manuel Alegre ressaltou ainda que todos os inscritos apresentam pseudónimos para não influenciarem o júri.
O pseudónimo escolhido por João Paulo Borges Coelho foi João Macaringue. Satisfeito por receber o segundo prémio da sua carreira, o moçambicano não deixou de recordar no entanto o primeiro, o Prémio José Craveirinha de Literatura, «a maior distinção das letras no meu país», com o livro «As Visitas do Dr. Valdez» (Caminho, 2004). A editora de José Saramago também lançou as seguintes obras do vencedor do Prémio Leya (as inscrições para o próximo ano já estão abertas e terminam no dia 31 de Maio) em Portugal:
«As Duas Sombras do Rio», 2003
«Índicos Indícios I. Setentrião», 2005
«Índicos Indícios II. Meridião», 2005
«Crónica da Rua 513.2», 2006
«Campo de Trânsito», 2007
«Hinyambaan», 2008
Hoje nas nuvens, João Paulo Borges Coelho deve a sua mulher o seu estado de graça, «pois ela que insistiu e tratou de tudo, que organizou todo o processo. Sinceramente, não acreditava que poderia vencer e não costumo participar neste tipo de iniciativas».
Sobre «O Olho de Hertzog», o moçambicano refere que há alguma continuidade com as suas anteriores, mas pouca, já que em cada livro procura «explorar outras vertentes, outros mundos». «Antes de tudo é um livro sobre Lourenço Marques, jogo com a história e com a imaginação, mas também tem um pouco de policial».
Devido ao prémio, não sabemos se João Paulo Borges Coelho conseguiu terminar a preparação da sua aula, mas certamente que os seus alunos não se vão importar. Também eles desejarão compartilhar as nuvens onde o escritor moçambicano se encontra neste momento…
(Noticía retirada do site Diário Digital, Texto: Pedro Justino Alves)
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